Estão presentes para o debate todos os estudantes do grupo 3: Molina, Alessandra, Lígia, Sheila, Denise, Francisca, Melissa, Marcelo, Pedro Ivo, Jéssica, Bruna, Pérolla, Thessa.
Apresenta-se, para esta sessão, a coordenadora Molina, bem como a secretária Thessa, que lavra esta registro.
A professora Claisy passa a palavra à coordenadora.
Molina questiona o grupo acerca das impressões iniciais de todos a respeito da figura do psicólogo escolar, antes que todos lessem a bibliografia proposta. O que os textos trouxeram de novo?
Segundo Pedro Ivo, sua impressão de senso-comum começou a mudar com sua participação em outras disciplinas. Ele comentar sobre o papel da psicologia na entrada na escola, na intervenção em problemas de aprendizagem, de formação. “Me dá a impressão de que havia um direcionamento da Psicologia em levar tudo para a anomalia, e não de se trabalhar nas situações de normalidade.”
A coordenadora retoma a palavra, e lembra que a psicologia escolar flerta com a clínica, com a organizacional, com a pedagogia, com a psiocopedagogia. Comenta também que profissões criadas recentemente confundem-se com a atuação do psicólogo escolar.
Para Bruna, justamente por esta área flertar com tantas outras, não tem um papel que se caracterize como da psicologia escolar apenas. Assim, acaba atuando muito como psicologia clínica no contexto escolar, no Brasil e no mundo.
Retomando a fala de Molina, Pedro relata não ter se atentado antes ao flerte da psicologia escolar com todas as outras áreas da psicologia, propondo também uma relação muito próxima daquela com a psicologia do treinamento.
Molina relembra que a atuação do psicólogo escolar não é necessariamente com os alunos, mas com as relações institucionais.
Pérolla comenta que, antes de ler os textos, interessava-se pelas diferenças entre o que a psicologia escolar deveria ser e o que de fato ela é. Na LBD, relata que se explicitam, entre as competências do psicólogo escolar, a realização de orientação, aconselhamento e psicoterapia. Segundo Pérolla, é interessante ver aí medicalização do papel do psicólogo.
Molina ressalta que o caráter de ‘profissional da saúde’ acompanhava o psicólogo escolar.
Bruna relembra que a partir dos anos 80 começa uma mobilização teórico-científica pra tentar mudar essa psicologia escolar, mas que este avanço ainda não atingiu a prática dos psicólogos.
Thessa comenta então sobre a importância da atuação dos profissionais individuais, que se apropriem da capacidade de operar mudanças, ao invés de esperar por uma conglomeração revolucionária de larga escala: “os psicólogos têm que ser formados e se formarem para terem condições pessoais e técnicas que os possibilitem operar as mudanças que eles esperam ver acontecer.”
Segundo Lígia, a psicologia escolar surgiu com transposição da clínica. À medida que tentativas foram feitas no sentido de terapeutizar a situação escolar, viu-se que o papel do psicólogo clínico, de quatro paredes, não era funcional. As situações de fracasso escolar são amplos e envolvem a família, a comunidade, a escola. Para ela, o papel do psicólogo depende muito do ‘querer fazer’: “Você pode ir procurar demanda, ao invés de esperar que ela caia no seu colo. Depende muito do profissional que tá na escola ter uma visão mais ampla.”
Bruna levanta a questão das dificuldades da formação na universidade como uma de suas inquietações.
Para Marcelo, o psicólogo ainda é o profissional envolvido com psicometria, avaliação. “A impressão que eu tenho é que o psicólogo escolar é uma figura idealizada, agente ativo, diferente da pessoa que está hoje na escola: um agente passivo e não transformador.”
Denise cita o livro da professora Claisy, que questiona a atuação dos psicólogos escolares no DF. 80% dos psicólogos escolares, segundo uma pesquisa relatada no livro, questionavam sua formação. A psicologia é formada a partir de uma interdisciplinariedade, mas hoje ela não consegue dissociar essas áreas afim de identificar sua área profissional. Quando as diretrizes trazem a questão da ‘psicoterapia’, trazem a questão da escuta do profissional de psicologia.
Pedro opina que alguns médicos dos anos 50 começaram a questionar a centralização da doença ao invés da saúde, e que a partir daí outras áreas do conhecimento começaram a fazer o mesmo. Ele retoma a noção de saúde como organização, funcionalidade. Critica a medicamentalização, e reclama o papel da psicologia como promotora de saúde, de bem estar, de uma sensação de adequação e pró-atividade.
Thessa lembra a diferença da escuta clínica para a atuação terapeutizante que o livro de Claisy aborda. Comenta que a escuta clínica caracteriza a especificidade do papel do psicólogo em quaisquer instituições que ele trabalhe. Opina que não se pode perder de vista a escuta das demandas individuais, mesmo que estejam orquestradas nas relações complexas da instituição escolar.
A coordenadora chama atenção do grupo ao resgate da parte histórica, identidade e formação, pois o debate está indo na direção da atuação do psicólogo escolar.
Para Marcelo, a escuta refere-se ao levantamento da problemática pra poder trabalhar as relações, em todas as situações de trabalho. “A armadilha mercadológica é do interesse que a própria instituição tem: a escola quer um psicólogo critico ou é mais conveniente ela ter um psicoterapeuta?”
Vários colegas respondem, alguns chamam atenção à culpabilização dos alunos e professores das situações-problema da escola. Comentam sobre a individualização das responsabilidades pelo fracasso escolar em agentes esecíficos, perdendo-se de vista a multicausalidade que opera no desenvolvimento dos alunos em período escolar.
Segundo Pedro, perde-se de vista a instituição.
Pérolla cita que naquele mesmo dia, numa aula sobre Análise do Comportamento, a professora citou um trecho sobre modelagem, que justamente reflete uma situação em que um terapeuta atua como professor. Segundo ela, o foco do exemplo da professora era: “Como seria a modelagem de um aluno ideal?” Portanto, Pérolla reflete: “O modelo do aluno bom ainda é o de sentar quietinho, direitinho. E ainda se fala em resolver o problema do aluno – sempre no aluno.”
Molina levanta a problemática das “aplicações preguiçosas” de diferentes abordagens teóricas, e chama a atenção para o fato de que a atuação individual de profissionais pode ser problemática e desinteressada de transformações na situação da escola.
Thessa acredita que pressupostos ideológicos definem as práticas que se executam no interior da escola. A depender da metavisão de homem a que um profissional da psicologia se filia, sua abordagem será mais ou menos transformadora. Sua atuação irá se direcionar para um posicionamento crítico da realidade e da escola, ou para uma adaptação higienista dos alunos ao sistema educacional e social.
Pérolla relembra a questão histórica da psicologia escolar. “A partir da década de 70, houve o começo das explicações biologizantes: ações exclusivas com o aluno, desconsiderando as instituições. Isso foi na década de 70, mas ainda está aí... pra onde será que a gente vai?”
A opinião de Denise é que o sujeito segundo o paradigma científico é fragmentado, e por esta visão deixa-se de lado o objetivo das relações que podem estar dentro da escola, centrando-se as intervenções, inclusive no contexto da escola, demasiadamente no indivíduo.
Para Sheila, o pressuposto que regeram ao longo do tempo as intervenções psi é o da medicalização, mais do que de prevenção. O foco tem se voltado recentemente para a prevenção, para o desenvolvimento.
Segundo Molina, “não podemos negligenciar as relações de poder: dependendo da escola em que se está, a intervenção transformadora fica mais difícil.”
Pedro traz um exemplo de uma reportagem da TV. Uma professora estava sofrendo cyber bulling, ameaças por email, etc. Ela se queixou à direção da escola, que primeiro colocou panos quentes, depois a demitiu. Resultado: Ela resolveu abandonar a docência. “Estamos vendo surgir uma cultura da impunidade e negligência a tentativas de solução dessas situações.”
Retomando a fala de Sheila, Jéssica propõe que a chave do problema é a prevenção, “mas fico me perguntando como isso pode funcionar. Percebo que há um recuo do psicólogo escolar na escola, pois não encontra portas abertas.” Comenta de sua experiência em um trabalho prático em um escola, onde o psicólogo escolar (um psicopedagogo, segundo o que todos o chamavam) não conseguia fazer intervenções diferentes das opções terapêuticas que a escola lhe oferecia.
Segundo Marcelo, o psicólogo escolar ainda é refém, e o pior é ele se comportar como refém, aceitando as imposições do empregador, sem clareza de sua atuação. “Essa inércia de 40 anos é que preocupa.”
Para Thessa, essa inércia é questionável, o que se atesta pela efervescência bibliográfica a que temos notícia, como esta do tutorial, bem como intervenções da psicologia escolar na realidade da escola, a que não tivemos acesso pois ainda estamos em fase de pesquisa bibliográfica.
A opinião de Marcelo é a de que a psicologia escolar se adaptou ao mercado, em uma “inércia de movimento”, não parada, mas demasiadamente adaptativa e pouco transformadora.
Pedro provoca: essa efervescência não é muito acadêmica? Segundo ele, precisam-se criar mecanismos de transbordamento, e não se produzir mais e mais conhecimento sem retorno efetivo às práticas cotidianas do contexto escolar.
Denise faz uma ressalva. Segundo ela, a função adaptativa da psicologia escolar remete aos seus primeiros estágios, quando a psicologia se associa à escola para entrar no Brasil.
Para Francisca, a formação é uma questão de suma importância. Ela questiona: “Quem é o profissional que está trabalhando? Nossa formação é basicamente voltada para clínica. Quando vamos para o mercado, não estamos preparados. Não temos capacitação.”
Thessa retoma a LDB, que dá ênfase à importância do estágio curricular, oportunidade em que o contato com a realidade das instituições não apenas prepara o aluno para ser ‘melhor formado’, mas ela própria, a instituição, pode ser afetada pela prática do estagiário.
Molina é da opinião de que se deveria oferecer estágios desde o início do curso, como também trazer-se a experiência advinda desta e de outras práticas para a academia. “Estamos aqui falando sem conhecer todas as nuances...”
Pérolla intervém lembrando que as pesquisas da parte da Psicologia escolar partem muito da vivencia da pessoa da equipe. E que no fim das contas, a contribuição para a formulação teórico-metodologicas que oferecem suporte consistente à prática profissional é quase zero. Então lança uma pergunta ao Marcelo: você acha que isso deveria partir dos psicólogos ou das instituições relacionadas à psicologia?
Marcelo: “acho utópico que o psicólogo se posicione confrontando as instituições. Ele precisaria ganhar autonomia antes de fazer isso, ou seu emprego é ameaçado. A LDB aos poucos começa a fazer isso. Mas enquanto o psicólogo está preso ao empregador, é difícil.”
Para Alessandra, a questão da formação aparece aí mais uma vez: talvez a questão seja o perfil deficiente da formação. “O psicólogo não sabe quais são as competências dele. Parece que ele não está afiliado a uma metodologia.”
Pérolla pergunta se a LDB ajuda nesse ponto?
Thessa responde lembrando alguns dos princípios noteadores da formação em psicologia das diretrizes curriculares, entre as quais figura: incentivo à produção em psicologia, com ênfase para a formação de profissionais que auxiliam e fomentam o debate da área.
Marcelo comenta que não existe uma agência na área de Psicologia. Para ele, o psicólogo infelizmente ainda não tem autonomia para executar seu trabalho de maneira criativa nas instituições escolares, acabando por se tornar um refém.
Lígia argumenta: “Concordo, tem que ter políticas publicas. Mas não necessariamente o psicólogo precisa ter posições subversivas o tempo todo, mas pode abrir espaços. Assim ele vai conquistando espaço e respeito.” Ela então dá exemplo da relação com a psicologia da saúde e o monopólio médico nos hospitais, alegando que nesta área muito já se avançou no diálogo entre os saberes e práticas, muito em função da ação insistente dos psicólogos. E conclui: “Nós seremos os psicólogos que poderão fazer formação continuada dos psicólogos que já estão nos campos.”
Retomando a fala de Lígia, Thessa lembra a importância de não idealizarmos a formação, acreditando que os problemas residem apenas nos quatro ou cinco anos da graduação. Uma das grandes chaves, segundo ela, é a formação continuada de psicólogos escolares já em atuação.
Lígia então opina que o debate acadêmico engrossa as possibilidades de atuação, bem como a prática de profissionais lança luz às pesquisas. Ela lança a pergunta: “será que as pessoas que estão trabalhando in locus não embasam, afinal, as pesquisas dos professores?”
Marcelo lembra que o apelo do psicólogo na instituição escolar representa uma consultoria de alto nível. “Por se tratar de uma mão de obra tão especializada, as pessoas que poderiam fazer esse tipo de trabalho dentro da escola talvez não se sujeitem aos péssimos salários.”
Molina recapitula então o enfoque sobre a conscientização dos demais profissionais e inclusive políticos quanto à função do psicólogo escolar. Segundo ela, essa consciência por parte dos parceiros profissionais de todas as área depende de todo o histórico da instituição onde trabalham todos, de suas filiações, de seus propósitos.
Sheila comenta que as diretrizes trazem esse diálogo entre áreas afins e áreas dentro da psicologia. Segundo ela, o fato de a interdisciplinaridade figurar no documento representa um importante avanço na formação.
Pérolla provoca: “Até agora olhamos muito pra trás, e pra um presente recortado. E se olharmos pra frente?”
Na opinião de Pedro Ivo, quando se delineiam competências, é necessário fazê-lo com responsabilidade, especialização e corporatividade. A corporação, segundo ele, tem que exigir uma coerência com um conjunto de princípios de seus trabalhadores. Ela define quais são as liberdades e deveres do profissional afiliado na aplicação deste trabalho. “Quando um profissional executa mal essa liberdades, tem que ficar claro o que se cobrará dele a partir disso.”
Molina fomenta o debate acerca do texto do INEP, e a questão do histórico em psicologia escolar. Pergunta se o ideário econômico do nosso tempo influencia o trabalho do psicólogo.
Pedro responde dizendo que pelos corredores da Psicologia na UnB se tenta pensar a psicologia para fora do ideário pré-estabelecido.
Segundo Thessa, a depender da abordagem a qual nos filiamos, nosso trabalho adquire caráter subversivo e transformador da realidade material em que vivemos, ou reprodutor das desigualdades. Para ela, esta é uma questão ética mais que metodológica, pois pressupõe a escolha de um olhar teórico que permeará toda a atuação. Ainda segundo ela, este é um olhar que não se perde, e por isso o psicólogo não precisa temer “perder a sua esperança ou coragem em ter uma atuação crítica”.
Bruna intervém afirmando que pensar uma psicologia transformadora ainda está muito no debate acadêmico. “Não é que não estejamos fazendo nada, mas a gente deveria fazer a teoria acontecer mais na prática.”
Segundo Melissa, um dos papéis do psicólogo escolar é a reflexão sobre como o aspecto econômico e social está refletido na escola. E sobre a formação, ela opina concordando com Bruna. “A teoria ainda é muito dissociada da prática. Responsabilidade social está distante da formação.”
Segundo Denise, a formação passa por uma leitura de uma sociedade capitalista. Ainda se ratificam os indivíduos dentro de um conceito de sujeito que é moldado e reproduzido pelo sistema educacional. A psicologia escolar, para ela, reproduz o modelo social.
Segundo Marcelo, a psicologia organizacional goza de uma autonomia que hoje o psicólogo escolar. Esta autonomia é que deve ser perseguida se quisermos ter atuações mais transformadoras e livres da lógica do mercado.
Para Sheila, o debate acabou voltando à questão da formação.
Jéssica faz uma análise geral do que falamos aqui até aqui: basicamente problemas. “Já conseguimos um pouco, já é uma melhora relevante. Temos que caminhar com passinhos de formiguinha.”
Bruna ressalta a importância de saírem daqui profissionais que possam trabalhar nisso: na reflexão e atuação na formação de novos psicólogos.
Alessandra: “O texto traz um exemplo de que professores reclamam demais da infraestrutura da escola, mas revela que o problema não está nas infraestrutura, mas na instituição como um todo.”
Thessa retoma aí a questão da formação continuada. “Não vamos sair prontos da graduação. Na nossa área, o saber não é pronto, constituído: tem que se refazer permanentemente.”
O Tutorial 1 trouxe muitas reflexões importantes. Apesar de estarmos sedentos para saber sobre a efetiva atuação do profissional psicólogo escolar e de desviar o curso da discussão para esse foco algumas vezes, pude perceber com maior clareza que grande parte dos problemas enfrentados na atuação do psicólogo, escolar ou do que atua em outras áreas, parte inicialmente de uma formação deficiente. Uma formação que às vezes privilegia demais a pesquisa em detrimento da prática, do estágio, da vivência. Uma formação em que muitas disciplinas essenciais são pouco estudadas, enquanto outras não tão relevantes são enfatizadas em demasia.
Por que no curso de Psicologia da UnB não existe estágio básico, em que competências necessárias para o trabalho em qualquer área de atuação são exercitadas? Por que existe apenas uma disciplina de Psicopatologia? Será mesmo possível estudar em um semestre, mesmo que superficialmente, a diversidade de psicopatologias atuais? Por que uma disciplina tão relevante para a pesquisa como a Psicometria não é obrigatória? Por que os alunos do curso só podem mesmo pôr a mão na massa a partir do sexto, sétimo semestre?
Além dessas e de muitas outras questões, permanece uma essencial: durante a formação pouquíssimo se discute sobre o papel de transformação social do psicólogo, sobre sua visão política, sobre suas possibilidades de modificar e aprimorar os sistemas do lado de fora da Universidade, e, é claro, também dentro da universidade; sobre a ética profissional, sobre o trabalho consciente, sobre os direitos e deveres do psicólogo, sobre o trabalho em conjunto com outros profissionais. Passamos tantas horas sentados ouvindo se falar de Freud, Vygotsky, Piaget, Skinner e tantos outros, mas será só isso o necessário a formação de um profissional competente, ético e atuante?