Registro do Debate do Tutorial 2 - Atuação do Psicólogo Escolar




A discussão se iniciou com uma pergunta provocativa: "até que ponto a formação continuada está estruturada?" Foi proposto que repensássemos a maneira pela qual essa formação tem acontecido, se ela aborda as várias dimensões determinantes dos problemas que afetam o processo ensino-aprendizagem.

Um participante sugeriu: ou a gente não consegue solucionar certos problemas recorrentes ou eles permanecem ativos no contexto, por alguma razão. "Na formação básica e continuada, os psicólogos escolares encontram dificuldades para lidar com essas questões. Ainda não conseguimos encontrar modos coletivos efetivos de trabalhar."

A coordenadora propôs: "como vocês pensavam, antes de lerem os textos, que era a atuação do psicólogo escolar na escola?"

A maioria dos integrantes concordou que pensavam a atuação como centrada no aluno-problema. Um integrante do grupo opinou que os próprios psicólogos escolares se deixam levar pelos estereótipos formados sobre sua categoria, e que essas formas de preconceito influenciam negativamente a atuação. Foi também discutido sobre os próprios psicólogos terem criado a situação da abordagem focada nas dificuldades do aluno.

O assunto seguinte foi a escuta clínica do psicólogo escolar. Será que ele não precisa, também, de uma supervisão? Será que não seria essencial, ou no mínimo relevante, que ele tivesse acompanhamento psicológico contínuo, para que, em "se ajudando", pudesse atuar com maior eficácia em contextos de ajuda? Se certas questões psíquicas do profissional não estiverem sanadas, aumenta a probabilidade de ocorrerem contratransferências durante a atuação, por exemplo. A escuta clínica, entretanto, deveria levar em consideração os processos institucionais do(s) contexto(s) em que o psicólogo escolar está atuando.

Uma integrante resgatou um dos temas propostos no início do tutorial: as dificuldades enfrentadas pelo psicólogo escolar na escola. A instituição não estaria preparada para receber esse profissional, porque ainda há muito preconceito ("lugar de psicólogo é na clínica"). Além disso, há uma série de processos excludentes operando no contexto escolar. Um integrante do grupo expressou seu não-entendimento da tão inflamada defesa do psicólogo na escola. Há mesmo tamanha necessidade? A realidade mostra, afinal, que o profissional não é bem-aceito, muitas vezes, pela escola, pela família...

Os diversos profissionais que atuam nesse contexto não compreendem a forma de atuação do psi. escolar; por isso, é importante a convocação de uma reunião inicial com toda a equipe envolvida no processo ensino-aprendizagem, para que se deixem claros os objetivos do psicólogo, sua perspectiva teórico-metodológica, sua visão de educação, de escola etc. A inserção na escola ocorreria aos poucos, conforme o profissional adquirisse maior confiança da instituição. Como disse uma integrante, não é suficiente que apenas nos apropriemos do conhecimento técnico, porque haveria risco de nos esquecermos das peculiaridades de cada escola. "Cada escola é uma escola, cada caso é um caso."

Quando a discussão sobre as dificuldades enfrentadas pelo psicólogo escolar na escola foi terminada, foram discutidas outras questões pertinentes:

- a importância de se articular o conhecimento psicológico com outras áreas do conhecimento, como antropologia, sociologia, pedagogia.

- o preparo do psicólogo escolar para dar conta do que está por trás das estruturas regimentais da escola (e cita, em seguida, as quatro dimensões fundamentais de atuação: mapeamento institucional, espaço de escuta psicológica, assessoria ao trabalho coletivo e acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem, exploradas no livro da Claisy). O psicólogo deveria atentar-se para o conhecimento das famílias dos alunos. Uma das integrantes do grupo, em contraposição a essa opinião, afirmou que a questão da família não é central na proposta do novo paradigma que guia a intervenção. Outra integrante crê que quando se privilegia a escuta da família, aumentam-se as chances de se perpetuarem os rótulos e preconceitos atualmente vigentes. Mais tarde, em outro momento da discussão, a questão familiar foi retomada: um dos membros disse que deveria ser feito um mapeamento familiar com mesmo grau de relevância que o mapeamento institucional; outra integrante tomou a família como participante da escola e como responsável pela posição e pelo comportamento do aluno no estabelecimento. A escuta familiar seria, portanto, uma forma de entender a demanda da comunidade.

- psicólogo como observador participante que prescinde da colaboração da instituição. Escola e psicólogo como parceiros na intervenção. Ouvir as "vozes institucionais" é fundamental no processo de atuação do psicólogo filiado ao paradigma sistêmico. Essa postura seria mais de escuta do que de diagnóstico.

- desafio da disciplina Psicologia Escolar de mobilizar os alunos politicamente, visando a prepará-los para uma atuação socialmente comprometida: formação politizada. Ademais, uma participante defendeu que o psicólogo tem que ter certeza de sua posição política para que a ação mobilizadora seja mais coerentemente planejada.

Por ser questão crítica para a psicologia escolar, foram lançados à discussão problemas relacionais professor-aluno. Conflitos entre professores e alunos foram exemplificados e tomados como fortemente relacionados ao sucesso/fracasso do processo de ensino-aprendizagem (objeto da psicologia escolar). Merecem, pois, atenção especial. Mas não se deixou de defender uma postura do psicólogo de estar atento às ações bem-sucedidas do professor. A parceria entre ambas as classes profissionais na promoção de saúde e na prevenção de condições "patologizantes" na escola deve ocorrer de forma que cada qual respeite o saber da outra.

Para que se haja respeito e se crie um clima de confiança entre psicólogo, professores e alunos, há várias coisas que o primeiro pode fazer antes de se inserir em uma sala de aula, tais como avisar que fará anotações, deixar claro em que lugar da sala vai se posicionar etc. Deve ser sempre franco, a ponto de não hesitar nem mesmo em confrontar professores e pais quando sentir ser necessário.

O psicólogo deve deixar aflorar sua criatividade. Há vários meios possíveis de intervenção, vários caminhos possíveis para se chegar a um resultado satisfatório. Deve, inclusive, facilitar e incentivar tantas estratégias diversas de ensino quanto lhe vierem à ideia. Com uma intervenção intencional, sistematicamente planejada, e em parceria com a escola, o psicólogo pode também atuar no sentido de potencializar as ações bem-sucedidas do professor.

Mas ele deve tomar cuidado com pretensões de onipotência: é importante que ouça o outro, que respeite o saber do outro. É desejável, para uma intervenção efetiva, que se tenha consciência do próprio "não-saber". A escola é fonte rica de saberes, e pode auxiliar tanto o trabalho do psicólogo quanto este o daquela.

Por fim, foi defendido que o psicólogo deve ser chamado para atuar por longo prazo. Uma intervenção tão-só pontual não previne possíveis futuros problemas no contexto escolar. A atuação deve ser permanente.

O Tutorial 2 chamou nossa atenção para a relevância da consciência da identidade profissional do psicólogo. O psicólogo escolar precisa ter clareza de suas atribuições, bem como ter clareza do que não compete a ele. Entretanto, é necessário lembrar que essa identidade profissional está em constante mudança, reformulação e atualização, ela não é estável.
O Tutorial foi muito proveitoso para esclarecer uma dúvida constante minha, e acredito, de muitos outros colegas. Antes dele eu tinha a clássica visão de que o psicólogo escolar é aquele ente na escola que vai tentar resolver os problemas, os fracassos escolares, as deficiências, no ritmo em que elas forem aparecendo. As aulas, as leituras e o debate do tutorial mostraram a amplitude da atuação do psicólogo, que pode e deve ir além do recebimento das demandas de fracasso, mas antecipá-las, atuando de forma preventiva, e não somente com foco no fracasso, mas, principalmente, no sucesso escolar. O trabalho deve ser em união com professores, orientadores, alunos e demais entes escolares, praticando sempre uma escuta ativa às opiões de tais entes.
Logicamente, isso não ocorre de uma hora para outra, mas o psicólogo pode ganhar seu espaço aos poucos, mostrando suas competências e mobilizando a participação de outros profissionais. Conforme isso for acontecendo será possível mostrar a eficiência da atuação do psicólogo escolar e assim, conquistar cada vez mais confiança e espaço para que o trabalho renda frutos de sucessos escolares.

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