Registro do Debate do Tutorial 2 - Atuação do Psicólogo Escolar




A discussão se iniciou com uma pergunta provocativa: "até que ponto a formação continuada está estruturada?" Foi proposto que repensássemos a maneira pela qual essa formação tem acontecido, se ela aborda as várias dimensões determinantes dos problemas que afetam o processo ensino-aprendizagem.

Um participante sugeriu: ou a gente não consegue solucionar certos problemas recorrentes ou eles permanecem ativos no contexto, por alguma razão. "Na formação básica e continuada, os psicólogos escolares encontram dificuldades para lidar com essas questões. Ainda não conseguimos encontrar modos coletivos efetivos de trabalhar."

A coordenadora propôs: "como vocês pensavam, antes de lerem os textos, que era a atuação do psicólogo escolar na escola?"

A maioria dos integrantes concordou que pensavam a atuação como centrada no aluno-problema. Um integrante do grupo opinou que os próprios psicólogos escolares se deixam levar pelos estereótipos formados sobre sua categoria, e que essas formas de preconceito influenciam negativamente a atuação. Foi também discutido sobre os próprios psicólogos terem criado a situação da abordagem focada nas dificuldades do aluno.

O assunto seguinte foi a escuta clínica do psicólogo escolar. Será que ele não precisa, também, de uma supervisão? Será que não seria essencial, ou no mínimo relevante, que ele tivesse acompanhamento psicológico contínuo, para que, em "se ajudando", pudesse atuar com maior eficácia em contextos de ajuda? Se certas questões psíquicas do profissional não estiverem sanadas, aumenta a probabilidade de ocorrerem contratransferências durante a atuação, por exemplo. A escuta clínica, entretanto, deveria levar em consideração os processos institucionais do(s) contexto(s) em que o psicólogo escolar está atuando.

Uma integrante resgatou um dos temas propostos no início do tutorial: as dificuldades enfrentadas pelo psicólogo escolar na escola. A instituição não estaria preparada para receber esse profissional, porque ainda há muito preconceito ("lugar de psicólogo é na clínica"). Além disso, há uma série de processos excludentes operando no contexto escolar. Um integrante do grupo expressou seu não-entendimento da tão inflamada defesa do psicólogo na escola. Há mesmo tamanha necessidade? A realidade mostra, afinal, que o profissional não é bem-aceito, muitas vezes, pela escola, pela família...

Os diversos profissionais que atuam nesse contexto não compreendem a forma de atuação do psi. escolar; por isso, é importante a convocação de uma reunião inicial com toda a equipe envolvida no processo ensino-aprendizagem, para que se deixem claros os objetivos do psicólogo, sua perspectiva teórico-metodológica, sua visão de educação, de escola etc. A inserção na escola ocorreria aos poucos, conforme o profissional adquirisse maior confiança da instituição. Como disse uma integrante, não é suficiente que apenas nos apropriemos do conhecimento técnico, porque haveria risco de nos esquecermos das peculiaridades de cada escola. "Cada escola é uma escola, cada caso é um caso."

Quando a discussão sobre as dificuldades enfrentadas pelo psicólogo escolar na escola foi terminada, foram discutidas outras questões pertinentes:

- a importância de se articular o conhecimento psicológico com outras áreas do conhecimento, como antropologia, sociologia, pedagogia.

- o preparo do psicólogo escolar para dar conta do que está por trás das estruturas regimentais da escola (e cita, em seguida, as quatro dimensões fundamentais de atuação: mapeamento institucional, espaço de escuta psicológica, assessoria ao trabalho coletivo e acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem, exploradas no livro da Claisy). O psicólogo deveria atentar-se para o conhecimento das famílias dos alunos. Uma das integrantes do grupo, em contraposição a essa opinião, afirmou que a questão da família não é central na proposta do novo paradigma que guia a intervenção. Outra integrante crê que quando se privilegia a escuta da família, aumentam-se as chances de se perpetuarem os rótulos e preconceitos atualmente vigentes. Mais tarde, em outro momento da discussão, a questão familiar foi retomada: um dos membros disse que deveria ser feito um mapeamento familiar com mesmo grau de relevância que o mapeamento institucional; outra integrante tomou a família como participante da escola e como responsável pela posição e pelo comportamento do aluno no estabelecimento. A escuta familiar seria, portanto, uma forma de entender a demanda da comunidade.

- psicólogo como observador participante que prescinde da colaboração da instituição. Escola e psicólogo como parceiros na intervenção. Ouvir as "vozes institucionais" é fundamental no processo de atuação do psicólogo filiado ao paradigma sistêmico. Essa postura seria mais de escuta do que de diagnóstico.

- desafio da disciplina Psicologia Escolar de mobilizar os alunos politicamente, visando a prepará-los para uma atuação socialmente comprometida: formação politizada. Ademais, uma participante defendeu que o psicólogo tem que ter certeza de sua posição política para que a ação mobilizadora seja mais coerentemente planejada.

Por ser questão crítica para a psicologia escolar, foram lançados à discussão problemas relacionais professor-aluno. Conflitos entre professores e alunos foram exemplificados e tomados como fortemente relacionados ao sucesso/fracasso do processo de ensino-aprendizagem (objeto da psicologia escolar). Merecem, pois, atenção especial. Mas não se deixou de defender uma postura do psicólogo de estar atento às ações bem-sucedidas do professor. A parceria entre ambas as classes profissionais na promoção de saúde e na prevenção de condições "patologizantes" na escola deve ocorrer de forma que cada qual respeite o saber da outra.

Para que se haja respeito e se crie um clima de confiança entre psicólogo, professores e alunos, há várias coisas que o primeiro pode fazer antes de se inserir em uma sala de aula, tais como avisar que fará anotações, deixar claro em que lugar da sala vai se posicionar etc. Deve ser sempre franco, a ponto de não hesitar nem mesmo em confrontar professores e pais quando sentir ser necessário.

O psicólogo deve deixar aflorar sua criatividade. Há vários meios possíveis de intervenção, vários caminhos possíveis para se chegar a um resultado satisfatório. Deve, inclusive, facilitar e incentivar tantas estratégias diversas de ensino quanto lhe vierem à ideia. Com uma intervenção intencional, sistematicamente planejada, e em parceria com a escola, o psicólogo pode também atuar no sentido de potencializar as ações bem-sucedidas do professor.

Mas ele deve tomar cuidado com pretensões de onipotência: é importante que ouça o outro, que respeite o saber do outro. É desejável, para uma intervenção efetiva, que se tenha consciência do próprio "não-saber". A escola é fonte rica de saberes, e pode auxiliar tanto o trabalho do psicólogo quanto este o daquela.

Por fim, foi defendido que o psicólogo deve ser chamado para atuar por longo prazo. Uma intervenção tão-só pontual não previne possíveis futuros problemas no contexto escolar. A atuação deve ser permanente.

O Tutorial 2 chamou nossa atenção para a relevância da consciência da identidade profissional do psicólogo. O psicólogo escolar precisa ter clareza de suas atribuições, bem como ter clareza do que não compete a ele. Entretanto, é necessário lembrar que essa identidade profissional está em constante mudança, reformulação e atualização, ela não é estável.
O Tutorial foi muito proveitoso para esclarecer uma dúvida constante minha, e acredito, de muitos outros colegas. Antes dele eu tinha a clássica visão de que o psicólogo escolar é aquele ente na escola que vai tentar resolver os problemas, os fracassos escolares, as deficiências, no ritmo em que elas forem aparecendo. As aulas, as leituras e o debate do tutorial mostraram a amplitude da atuação do psicólogo, que pode e deve ir além do recebimento das demandas de fracasso, mas antecipá-las, atuando de forma preventiva, e não somente com foco no fracasso, mas, principalmente, no sucesso escolar. O trabalho deve ser em união com professores, orientadores, alunos e demais entes escolares, praticando sempre uma escuta ativa às opiões de tais entes.
Logicamente, isso não ocorre de uma hora para outra, mas o psicólogo pode ganhar seu espaço aos poucos, mostrando suas competências e mobilizando a participação de outros profissionais. Conforme isso for acontecendo será possível mostrar a eficiência da atuação do psicólogo escolar e assim, conquistar cada vez mais confiança e espaço para que o trabalho renda frutos de sucessos escolares.

Mentes Perigosas

No filme Mentes Perigosas vemos uma professora tentando ensinar uma classe “especial” de alunos montada pela escola na qual foi contratada: os chamados alunos-problema. A personagem LouAnne encara uma nova realidade ao enfrentar uma classe multi-étnica cujos alunos são desmotivados, desrespeitosos e violentos. A professora não consegue ganhar a atenção da classe por meio de métodos tradicionais, e passa então a faze uso de técnicas típicas da análise do comportamento como reforçar comportamentos adequados, deixar de reforçar os inadequados e ir aos poucos retirando os reforços arbitrários para que surja o reforço natural – no caso, o prazer de estudar, o conhecimento. Assim, a professora dá doces, balas, um jantar em um bom restaurante e um passeio no parque de diversão quando os alunos prestavam atenção a sua aula ou faziam as tarefas de casa, ou minimamente se esforçavam. Aos poucos, ela vai ganhando a confiança e o respeito dos alunos, porém para tanto, ela se envolve intimamente no mundo deles, fazendo muito mais do que as atribuições de professora. Ela vai a casa de alguns alunos, procura conversar com suas famílias e chega ao ponto de abrigar um de seus pupilos em sua casa, pois ele estava ameaçado de morte. Com esse mergulho, ela percebe a realidade triste dos alunos que vivem em condições precárias de segurança, extremamente vulneráveis, alvos fáceis de traficantes e bandidos e com escassos recursos materiais. Ao se deparar com a história de vida dos alunos e com o contexto em que cresceram, será que é possível culpá-los indiscriminadamente por sua rebeldia, seu jeito agressivo e pela falta de interesse nos estudos? Afinal, a maioria deles não tinha nenhum exemplo, nenhum modelo próximo a suas realidades que tivesse sido bem sucedido por meio dos estudos. A psicologia sócio-histórica nos alerta para a importância de considerar a cultura e o contexto em que se desenvolve o indivíduo. Cada aluno é único e tem um repertório vastíssimo de experiências com uma rede social específica que auxiliou no seu desenvolvimento. LouAnne, diferentemente de muitos professores, se atenta a esses aspectos anteriores à escola, e com essa estratégia obtém excelentes resultados para uma turma até então abandonada. No entanto, pode-se questionar se ela não tomou para si muito mais obrigações do que deveria e até do que podia, tendo que tornar-se uma super-heroína para dar conta de todos os problemas da turma. Até onde vão as atribuições do professor? Vemos claramente no filme um sistema de ensino precariamente organizado e limitadíssimo pelas regras da secretaria de educação, muitas delas absolutamente incoerentes. O filme para mim foi um exemplo claríssimo da necessidade da presença de um (ou mais) psicólogo escolar na escola, inserido mesmo no ambiente dela, podendo avaliar com clareza sua dinâmica, conhecer os alunos, os professores e junto a eles promover um trabalho que enfatizasse as potencialidades dos alunos, não seus comprometimentos, reduzisse a segregação entre os alunos “bons” e os “ruins”, estimulasse o diálogo entre os professores e dos professores com os alunos, mobilizasse a luta frente às regras ilógicas da secretaria de educação entre tantas outras melhorias, obviamente, tudo isso muito, muito aos poucos. Mas a escola precisa desse agente que possa ser o mediador entre seus diversos entes, que possa principalmente escutá-los, dar voz a suas demandas de tal forma que a escola possa privilegiar ao máximo o fornecimento do seu produto que é o seu grande objetivo e maior bem: o conhecimento dos alunos.

Ética


Por que não estudamos ética na prática? Com exercícios na vida real, ao ar livre, uns com os outros, compartilhando sentimentos e opiniões com os colegas? Por que situações que são exemplos brilhantes para a filosofia, a sociologia e que passaram no jornal de ontem não podem ser o tema da aula de hoje? Temos que continuar somente lendo o texto grande e pesado sobre a diferença e as origens da ética e da moral, no livro da escola? Será que a ética é compreendida somente com o conhecimento teórico?

Propaganda





Achei essa propaganda muito ilustrativa da mentalidade de muitos professores até os dias de hoje, que se atentam bem mais às normas, notas e regulamentos do que ao bem maior que podem fornecer aos estudantes: o conhecimento, as aulas. Não estou dizendo que cada aluno pode chegar na hora que bem entender na classe. Obviamente devem existir regras na escola que evitem que as coisas fiquem desorganizadas. O padrão de horário de chegada, de intervalo, uniforme para todos, médias e etc é necessário até para que não haja injustiças. Porém quantas vezes vemos alunos interessados sendo injustiçados simplesmente porque o professor não foi com a sua cara? Porque é extrovertido demais, ou tímido demais? Porque aquela aluna passa muito a mão nos cabelos? Porque aquele outro tem aquela mania irritante de escrever comlápis, e não com caneta? Porque a letra desse outro é grande demais/pequena demais? Porque aquele aluno bocejou na minha sala às 7h10 da manhã e eu acho isso uma tremenda falta de respeito?? E aquele professor de exatas da UnB que decidiu ao início do curso que nesse semestre só metade da turma passará na sua matéria?
A verdade é que a escola para mim parece ainda estar coberta de imposições que importam muito pouco comparadas ao que realmente importa.

Memorial


Registro de duas experiências da vida escolar - uma positiva, outra negativa.

Experiência positiva:
Aos oito anos, na segunda série, a professora pediu que cada aluno da classe escrevesse uma poesia sobre o tema "amizade" em homenagem ao dia do amigo. Nós tinhamos aprendido recentemente o que era uma poesia e íamos exercitar o conhecimento através dessa atividade. A maioria dos alunos escreveu quatro ou cinco linhas, eu escrevi onze! Cheias de erros de português, é claro, mas cheias do "conteúdo" que estava a meu alcance. A professora passou por cada carteira lendo as poesias. Quando chegou na minha, ao final da leitura, ela me levantou da cadeira em um abraço, disse que minha poesia estava ótima e que ela estava muito orgulhosa de mim. No dia seguinte havia cartazes reproduzindo minha poesia por toda a escola. Eu nunca tinha me sentido tão inteligente, motivada, muito feliz! Desde esse dia comecei a produzir poesias e nunca mais parei.

Experiência negativa:
Aos doze anos, na sexta série, um colega tinha o hábito de me importunar, não sei porque. Bem, ele fazia isso com todos, na realidade, mas principalmente comigo, talvez por eu ser a mais quietinha e tímida. Um dia ele pediu minha borracha emprestada e eu não dei, disse para pedir a de outra pessoa ou comprar uma logo. Ele vivia pedindo os materias dos colegas emprestado e nunca devolvia. Eu já tinha perdido uma borracha e alguns lápis para ele. Ele ficou furioso com meu aparente "desafio", levantou da sua carteira e foi até mim muito sério e ameaçador "não vai me emprestar?". Eu disse simplesmente "não". Ele passou para trás da minha carteira e começou a apertar meu pescoço, de costa pra mim. Eu gritei para ele parar, tentei fazer sinal para a professora, mas a sala estava em uma atividade de grupo, uma bagunça, todo mundo falando alto, ninguém me ouviu além das minhas colegas de grupo que começaram a gritar por socorro e tentar tirar as mãos dele do meu pescoço. Ele não estava me enforcando de verdade, eu conseguia respirar, mas ele estava me machucando e eu já tinha gritado e muito para ele me largar. Tudo isso aconteceu muito rapidamente, até que eu vi minha lapiseira com uma pontinha de grafite para fora na minha mão. Não tive dúvida: mirei a lapiseira com toda a força na mão que apertava meu pescoço. Ela fez um pequeno furinho na mão dele, ele gritou e me largou. Olhou com raiva para mim e saiu correndo da sala. Ele não voltou até a aula seguinte, escoltado por um '"bedel" que anunciou que a aluna Sheila era esperada na coodenação. Eu me levantei e fui, morta de medo, nunca tinha sido chamada na cordenação. Chegando lá a coordenadora que me esperava nem se deu ao trabalho de se levantar da cadeira ou pedir para eu sentar para que conversássemos. Ela simplesmente disse "eu vi o que você fiz com o fulano de tal. Um absurdo! Você viu que você o machucou? Eu não gostei NEM UM POUCO do que a senhorita fez, nem um pouco, e se isso se repetir você vai tomar uma advertência". Eu já estava chorando, mas tive coragem para perguntar "eu posso falar o que aconteceu?". Ela respondeu "eu VI o que aconteceu e já disse que de outra vez você toma advertência. Agora vá já para sua sala que está perdendo a aula. JÁ PRA SALA!"e foi me empurrando para fora. Eu continuei chorando por um tempo, não fui direto para a sala, fui para o banheiro chorar. Me senti completamente injustiçada. Foi uma sensação horrível. O pior foi que não contei a meus pais o que tinha acontecido, senão anos depois. Tive medo de meus pais irem a escola para reclamar e eu sofrer retaliações. Tive muito medo de ser novamente atacada por aquele colega.


As minhas duas experiências fizeram mais uma vez que eu refetisse sobre a importância da atuação consciente de professores, coordenadores, psicólogos escolares e toda a equipe da escola, pois um momento de inobservância ou um momento de elogio podem ser a chave para o desenvolvimento de um aluno brilhante, ou de um trauma. Especialmente quando se é jovem, quanto mais criança se é, mais a opinião dos adultos é levada muito a sério. Ver um adulto te elogiar, ver um professor falar que você é um novo Picasso, pode fazer toda a diferença na vida escolar e no desenvolvimento de uma pessoa. Por outro lado, veja o que a coordenadora da sexta série fez comigo. Ela não somente não ouviu uma denúncia que eu faria sobre um aluno perigoso, que impotunava e brigava com a classe inteira, como me deixou desprotegida frente a ele, e ainda me sintindo culpada pelo que fiz exclusivamente em minha defesa. Aí deveria entrar fortemente o trabalho do psicólogo escolar. Não somente para ouvir essa aluna tímida com um problema e esse aluno brigão, mas para orientar a ação de professores e coordenadores, trabalhar junto a eles, investigar a situação desses alunos. MAS, não havia psicólogo escolar na minha escola... E se houvesse, será que ele teria feito o "certo"?

Registo do Debate do Tutorial 1 - Formação do Psicólogo Escolar


No início da reunião a professora Claisy começa explicando que esta atividade é baseada em uma metodologia usada internacionalmente: atividade por solução de problemas, um modelo que não é novo, apesar de não existir na UnB. Há experiências com esta metodologia também no país, como a USP leste, toda organizada nessa modalidade curricular. A professora esclarece que usa o tutorial como uma adaptação deste modelo, defendendo que esta alternativa metodológica é uma saída para a articulação entre teoria e prática, um processo meta cognitivo.
A seguir faz um esclarecimento sobre o seminário, que se pretende um diálogo com a realidade. A partir das leituras que fizemos, a orientação é buscar na prática a problematização da realidade, para trazermos para uma conversa ampliada com todos os colegas.
Estão presentes para o debate todos os estudantes do grupo 3: Molina, Alessandra, Lígia, Sheila, Denise, Francisca, Melissa, Marcelo, Pedro Ivo, Jéssica, Bruna, Pérolla, Thessa.
Apresenta-se, para esta sessão, a coordenadora Molina, bem como a secretária Thessa, que lavra esta registro.
A professora Claisy passa a palavra à coordenadora.
Molina questiona o grupo acerca das impressões iniciais de todos a respeito da figura do psicólogo escolar, antes que todos lessem a bibliografia proposta. O que os textos trouxeram de novo?
Segundo Pedro Ivo, sua impressão de senso-comum começou a mudar com sua participação em outras disciplinas. Ele comentar sobre o papel da psicologia na entrada na escola, na intervenção em problemas de aprendizagem, de formação. “Me dá a impressão de que havia um direcionamento da Psicologia em levar tudo para a anomalia, e não de se trabalhar nas situações de normalidade.”
A coordenadora retoma a palavra, e lembra que a psicologia escolar flerta com a clínica, com a organizacional, com a pedagogia, com a psiocopedagogia. Comenta também que profissões criadas recentemente confundem-se com a atuação do psicólogo escolar.
Para Bruna, justamente por esta área flertar com tantas outras, não tem um papel que se caracterize como da psicologia escolar apenas. Assim, acaba atuando muito como psicologia clínica no contexto escolar, no Brasil e no mundo.
Retomando a fala de Molina, Pedro relata não ter se atentado antes ao flerte da psicologia escolar com todas as outras áreas da psicologia, propondo também uma relação muito próxima daquela com a psicologia do treinamento.
Molina relembra que a atuação do psicólogo escolar não é necessariamente com os alunos, mas com as relações institucionais.
Pérolla comenta que, antes de ler os textos, interessava-se pelas diferenças entre o que a psicologia escolar deveria ser e o que de fato ela é. Na LBD, relata que se explicitam, entre as competências do psicólogo escolar, a realização de orientação, aconselhamento e psicoterapia. Segundo Pérolla, é interessante ver aí medicalização do papel do psicólogo.
Molina ressalta que o caráter de ‘profissional da saúde’ acompanhava o psicólogo escolar.
Bruna relembra que a partir dos anos 80 começa uma mobilização teórico-científica pra tentar mudar essa psicologia escolar, mas que este avanço ainda não atingiu a prática dos psicólogos.
Thessa comenta então sobre a importância da atuação dos profissionais individuais, que se apropriem da capacidade de operar mudanças, ao invés de esperar por uma conglomeração revolucionária de larga escala: “os psicólogos têm que ser formados e se formarem para terem condições pessoais e técnicas que os possibilitem operar as mudanças que eles esperam ver acontecer.”
Segundo Lígia, a psicologia escolar surgiu com transposição da clínica. À medida que tentativas foram feitas no sentido de terapeutizar a situação escolar, viu-se que o papel do psicólogo clínico, de quatro paredes, não era funcional. As situações de fracasso escolar são amplos e envolvem a família, a comunidade, a escola. Para ela, o papel do psicólogo depende muito do ‘querer fazer’: “Você pode ir procurar demanda, ao invés de esperar que ela caia no seu colo. Depende muito do profissional que tá na escola ter uma visão mais ampla.”
Bruna levanta a questão das dificuldades da formação na universidade como uma de suas inquietações.
Para Marcelo, o psicólogo ainda é o profissional envolvido com psicometria, avaliação. “A impressão que eu tenho é que o psicólogo escolar é uma figura idealizada, agente ativo, diferente da pessoa que está hoje na escola: um agente passivo e não transformador.”
Denise cita o livro da professora Claisy, que questiona a atuação dos psicólogos escolares no DF. 80% dos psicólogos escolares, segundo uma pesquisa relatada no livro, questionavam sua formação. A psicologia é formada a partir de uma interdisciplinariedade, mas hoje ela não consegue dissociar essas áreas afim de identificar sua área profissional. Quando as diretrizes trazem a questão da ‘psicoterapia’, trazem a questão da escuta do profissional de psicologia.
Pedro opina que alguns médicos dos anos 50 começaram a questionar a centralização da doença ao invés da saúde, e que a partir daí outras áreas do conhecimento começaram a fazer o mesmo. Ele retoma a noção de saúde como organização, funcionalidade. Critica a medicamentalização, e reclama o papel da psicologia como promotora de saúde, de bem estar, de uma sensação de adequação e pró-atividade.
Thessa lembra a diferença da escuta clínica para a atuação terapeutizante que o livro de Claisy aborda. Comenta que a escuta clínica caracteriza a especificidade do papel do psicólogo em quaisquer instituições que ele trabalhe. Opina que não se pode perder de vista a escuta das demandas individuais, mesmo que estejam orquestradas nas relações complexas da instituição escolar.
A coordenadora chama atenção do grupo ao resgate da parte histórica, identidade e formação, pois o debate está indo na direção da atuação do psicólogo escolar.
Para Marcelo, a escuta refere-se ao levantamento da problemática pra poder trabalhar as relações, em todas as situações de trabalho. “A armadilha mercadológica é do interesse que a própria instituição tem: a escola quer um psicólogo critico ou é mais conveniente ela ter um psicoterapeuta?”
Vários colegas respondem, alguns chamam atenção à culpabilização dos alunos e professores das situações-problema da escola. Comentam sobre a individualização das responsabilidades pelo fracasso escolar em agentes esecíficos, perdendo-se de vista a multicausalidade que opera no desenvolvimento dos alunos em período escolar.
Segundo Pedro, perde-se de vista a instituição.
Pérolla cita que naquele mesmo dia, numa aula sobre Análise do Comportamento, a professora citou um trecho sobre modelagem, que justamente reflete uma situação em que um terapeuta atua como professor. Segundo ela, o foco do exemplo da professora era: “Como seria a modelagem de um aluno ideal?” Portanto, Pérolla reflete: “O modelo do aluno bom ainda é o de sentar quietinho, direitinho. E ainda se fala em resolver o problema do aluno – sempre no aluno.”
Molina levanta a problemática das “aplicações preguiçosas” de diferentes abordagens teóricas, e chama a atenção para o fato de que a atuação individual de profissionais pode ser problemática e desinteressada de transformações na situação da escola.
Thessa acredita que pressupostos ideológicos definem as práticas que se executam no interior da escola. A depender da metavisão de homem a que um profissional da psicologia se filia, sua abordagem será mais ou menos transformadora. Sua atuação irá se direcionar para um posicionamento crítico da realidade e da escola, ou para uma adaptação higienista dos alunos ao sistema educacional e social.
Pérolla relembra a questão histórica da psicologia escolar. “A partir da década de 70, houve o começo das explicações biologizantes: ações exclusivas com o aluno, desconsiderando as instituições. Isso foi na década de 70, mas ainda está aí... pra onde será que a gente vai?”
A opinião de Denise é que o sujeito segundo o paradigma científico é fragmentado, e por esta visão deixa-se de lado o objetivo das relações que podem estar dentro da escola, centrando-se as intervenções, inclusive no contexto da escola, demasiadamente no indivíduo.
Para Sheila, o pressuposto que regeram ao longo do tempo as intervenções psi é o da medicalização, mais do que de prevenção. O foco tem se voltado recentemente para a prevenção, para o desenvolvimento.
Segundo Molina, “não podemos negligenciar as relações de poder: dependendo da escola em que se está, a intervenção transformadora fica mais difícil.”
Pedro traz um exemplo de uma reportagem da TV. Uma professora estava sofrendo cyber bulling, ameaças por email, etc. Ela se queixou à direção da escola, que primeiro colocou panos quentes, depois a demitiu. Resultado: Ela resolveu abandonar a docência. “Estamos vendo surgir uma cultura da impunidade e negligência a tentativas de solução dessas situações.”
Retomando a fala de Sheila, Jéssica propõe que a chave do problema é a prevenção, “mas fico me perguntando como isso pode funcionar. Percebo que há um recuo do psicólogo escolar na escola, pois não encontra portas abertas.” Comenta de sua experiência em um trabalho prático em um escola, onde o psicólogo escolar (um psicopedagogo, segundo o que todos o chamavam) não conseguia fazer intervenções diferentes das opções terapêuticas que a escola lhe oferecia.
Segundo Marcelo, o psicólogo escolar ainda é refém, e o pior é ele se comportar como refém, aceitando as imposições do empregador, sem clareza de sua atuação. “Essa inércia de 40 anos é que preocupa.”
Para Thessa, essa inércia é questionável, o que se atesta pela efervescência bibliográfica a que temos notícia, como esta do tutorial, bem como intervenções da psicologia escolar na realidade da escola, a que não tivemos acesso pois ainda estamos em fase de pesquisa bibliográfica.
A opinião de Marcelo é a de que a psicologia escolar se adaptou ao mercado, em uma “inércia de movimento”, não parada, mas demasiadamente adaptativa e pouco transformadora.
Pedro provoca: essa efervescência não é muito acadêmica? Segundo ele, precisam-se criar mecanismos de transbordamento, e não se produzir mais e mais conhecimento sem retorno efetivo às práticas cotidianas do contexto escolar.
Denise faz uma ressalva. Segundo ela, a função adaptativa da psicologia escolar remete aos seus primeiros estágios, quando a psicologia se associa à escola para entrar no Brasil.
Para Francisca, a formação é uma questão de suma importância. Ela questiona: “Quem é o profissional que está trabalhando? Nossa formação é basicamente voltada para clínica. Quando vamos para o mercado, não estamos preparados. Não temos capacitação.”
Thessa retoma a LDB, que dá ênfase à importância do estágio curricular, oportunidade em que o contato com a realidade das instituições não apenas prepara o aluno para ser ‘melhor formado’, mas ela própria, a instituição, pode ser afetada pela prática do estagiário.
Molina é da opinião de que se deveria oferecer estágios desde o início do curso, como também trazer-se a experiência advinda desta e de outras práticas para a academia. “Estamos aqui falando sem conhecer todas as nuances...”
Pérolla intervém lembrando que as pesquisas da parte da Psicologia escolar partem muito da vivencia da pessoa da equipe. E que no fim das contas, a contribuição para a formulação teórico-metodologicas que oferecem suporte consistente à prática profissional é quase zero. Então lança uma pergunta ao Marcelo: você acha que isso deveria partir dos psicólogos ou das instituições relacionadas à psicologia?
Marcelo: “acho utópico que o psicólogo se posicione confrontando as instituições. Ele precisaria ganhar autonomia antes de fazer isso, ou seu emprego é ameaçado. A LDB aos poucos começa a fazer isso. Mas enquanto o psicólogo está preso ao empregador, é difícil.”
Para Alessandra, a questão da formação aparece aí mais uma vez: talvez a questão seja o perfil deficiente da formação. “O psicólogo não sabe quais são as competências dele. Parece que ele não está afiliado a uma metodologia.”
Pérolla pergunta se a LDB ajuda nesse ponto?
Thessa responde lembrando alguns dos princípios noteadores da formação em psicologia das diretrizes curriculares, entre as quais figura: incentivo à produção em psicologia, com ênfase para a formação de profissionais que auxiliam e fomentam o debate da área.
Marcelo comenta que não existe uma agência na área de Psicologia. Para ele, o psicólogo infelizmente ainda não tem autonomia para executar seu trabalho de maneira criativa nas instituições escolares, acabando por se tornar um refém.
Lígia argumenta: “Concordo, tem que ter políticas publicas. Mas não necessariamente o psicólogo precisa ter posições subversivas o tempo todo, mas pode abrir espaços. Assim ele vai conquistando espaço e respeito.” Ela então dá exemplo da relação com a psicologia da saúde e o monopólio médico nos hospitais, alegando que nesta área muito já se avançou no diálogo entre os saberes e práticas, muito em função da ação insistente dos psicólogos. E conclui: “Nós seremos os psicólogos que poderão fazer formação continuada dos psicólogos que já estão nos campos.”
Retomando a fala de Lígia, Thessa lembra a importância de não idealizarmos a formação, acreditando que os problemas residem apenas nos quatro ou cinco anos da graduação. Uma das grandes chaves, segundo ela, é a formação continuada de psicólogos escolares já em atuação.
Lígia então opina que o debate acadêmico engrossa as possibilidades de atuação, bem como a prática de profissionais lança luz às pesquisas. Ela lança a pergunta: “será que as pessoas que estão trabalhando in locus não embasam, afinal, as pesquisas dos professores?”
Marcelo lembra que o apelo do psicólogo na instituição escolar representa uma consultoria de alto nível. “Por se tratar de uma mão de obra tão especializada, as pessoas que poderiam fazer esse tipo de trabalho dentro da escola talvez não se sujeitem aos péssimos salários.”
Molina recapitula então o enfoque sobre a conscientização dos demais profissionais e inclusive políticos quanto à função do psicólogo escolar. Segundo ela, essa consciência por parte dos parceiros profissionais de todas as área depende de todo o histórico da instituição onde trabalham todos, de suas filiações, de seus propósitos.
Sheila comenta que as diretrizes trazem esse diálogo entre áreas afins e áreas dentro da psicologia. Segundo ela, o fato de a interdisciplinaridade figurar no documento representa um importante avanço na formação.
Pérolla provoca: “Até agora olhamos muito pra trás, e pra um presente recortado. E se olharmos pra frente?”
Na opinião de Pedro Ivo, quando se delineiam competências, é necessário fazê-lo com responsabilidade, especialização e corporatividade. A corporação, segundo ele, tem que exigir uma coerência com um conjunto de princípios de seus trabalhadores. Ela define quais são as liberdades e deveres do profissional afiliado na aplicação deste trabalho. “Quando um profissional executa mal essa liberdades, tem que ficar claro o que se cobrará dele a partir disso.”
Molina fomenta o debate acerca do texto do INEP, e a questão do histórico em psicologia escolar. Pergunta se o ideário econômico do nosso tempo influencia o trabalho do psicólogo.
Pedro responde dizendo que pelos corredores da Psicologia na UnB se tenta pensar a psicologia para fora do ideário pré-estabelecido.
Segundo Thessa, a depender da abordagem a qual nos filiamos, nosso trabalho adquire caráter subversivo e transformador da realidade material em que vivemos, ou reprodutor das desigualdades. Para ela, esta é uma questão ética mais que metodológica, pois pressupõe a escolha de um olhar teórico que permeará toda a atuação. Ainda segundo ela, este é um olhar que não se perde, e por isso o psicólogo não precisa temer “perder a sua esperança ou coragem em ter uma atuação crítica”.
Bruna intervém afirmando que pensar uma psicologia transformadora ainda está muito no debate acadêmico. “Não é que não estejamos fazendo nada, mas a gente deveria fazer a teoria acontecer mais na prática.”
Segundo Melissa, um dos papéis do psicólogo escolar é a reflexão sobre como o aspecto econômico e social está refletido na escola. E sobre a formação, ela opina concordando com Bruna. “A teoria ainda é muito dissociada da prática. Responsabilidade social está distante da formação.”
Segundo Denise, a formação passa por uma leitura de uma sociedade capitalista. Ainda se ratificam os indivíduos dentro de um conceito de sujeito que é moldado e reproduzido pelo sistema educacional. A psicologia escolar, para ela, reproduz o modelo social.
Segundo Marcelo, a psicologia organizacional goza de uma autonomia que hoje o psicólogo escolar. Esta autonomia é que deve ser perseguida se quisermos ter atuações mais transformadoras e livres da lógica do mercado.
Para Sheila, o debate acabou voltando à questão da formação.
Jéssica faz uma análise geral do que falamos aqui até aqui: basicamente problemas. “Já conseguimos um pouco, já é uma melhora relevante. Temos que caminhar com passinhos de formiguinha.”
Bruna ressalta a importância de saírem daqui profissionais que possam trabalhar nisso: na reflexão e atuação na formação de novos psicólogos.
Alessandra: “O texto traz um exemplo de que professores reclamam demais da infraestrutura da escola, mas revela que o problema não está nas infraestrutura, mas na instituição como um todo.”
Thessa retoma aí a questão da formação continuada. “Não vamos sair prontos da graduação. Na nossa área, o saber não é pronto, constituído: tem que se refazer permanentemente.”

O Tutorial 1 trouxe muitas reflexões importantes. Apesar de estarmos sedentos para saber sobre a efetiva atuação do profissional psicólogo escolar e de desviar o curso da discussão para esse foco algumas vezes, pude perceber com maior clareza que grande parte dos problemas enfrentados na atuação do psicólogo, escolar ou do que atua em outras áreas, parte inicialmente de uma formação deficiente. Uma formação que às vezes privilegia demais a pesquisa em detrimento da prática, do estágio, da vivência. Uma formação em que muitas disciplinas essenciais são pouco estudadas, enquanto outras não tão relevantes são enfatizadas em demasia.
Por que no curso de Psicologia da UnB não existe estágio básico, em que competências necessárias para o trabalho em qualquer área de atuação são exercitadas? Por que existe apenas uma disciplina de Psicopatologia? Será mesmo possível estudar em um semestre, mesmo que superficialmente, a diversidade de psicopatologias atuais? Por que uma disciplina tão relevante para a pesquisa como a Psicometria não é obrigatória? Por que os alunos do curso só podem mesmo pôr a mão na massa a partir do sexto, sétimo semestre?
Além dessas e de muitas outras questões, permanece uma essencial: durante a formação pouquíssimo se discute sobre o papel de transformação social do psicólogo, sobre sua visão política, sobre suas possibilidades de modificar e aprimorar os sistemas do lado de fora da Universidade, e, é claro, também dentro da universidade; sobre a ética profissional, sobre o trabalho consciente, sobre os direitos e deveres do psicólogo, sobre o trabalho em conjunto com outros profissionais. Passamos tantas horas sentados ouvindo se falar de Freud, Vygotsky, Piaget, Skinner e tantos outros, mas será só isso o necessário a formação de um profissional competente, ético e atuante?

De Luria

Em uma das atividades desse semestre, meu grupo de trabalho - Denise Clésia, Lígia Carvalho Libâneo, Francisca Juliana, Jéssica Azevêdo, Melissa Castro e eu - reproduzimos um experimento feito por Alexander Luria sob supervisão de Vygotsky em meados da década de 1930. O experimento foi originalmente feito com a população de aldeias nômades do Uzbekistão e da Kirgizia e tratava de temas como percepção, memória, resolução de problemas etc. Nosso grupo tratou especificamente dos temas dedução e inferência. Para tanto, apresentamos dois tipos de silogismos aos 11 participantes da nossa investigação, um deles representado com uma figura cotidiana (carro), e outro com símbolos alheios a realidade e cultura brasileira (neve e urso polar).

O silogismo é um dos mecanismos objetivos que surgem no processo de desenvolvimento da atividade cognitiva. Um exemplo de silogismo é:

“Metais precisos não enferrujam (julgamento geral). O ouro é um metal precioso (proposição particular). O ouro enferruja?”

Quando uma pessoa possui um aparato lógico complexo e bem desenvolvido é possível que conclusões sejam tiradas a partir de premissas dadas sem ter de recorrer à experiência gráfico-funcional, ou seja, mesmo que a pessoa não tenha tido contado físico ou direto com aquela realidade. Portanto, o objetivo de nossa investigação foi mostrar como ocorria o processo de inferência a partir de silogismos, observando se as pessoas seriam ou não capazes de responder corretamente aos silogismos apresentados, mesmo àquele que tratava de uma situação não inserida em suas realidades.

Os silogismos apresentados por nós foram:

Todos os carros têm pneus.
Camaro é um carro. Camaro tem pneus?

e

No Norte onde tem neve, todos os ursos são brancos. Alasca fica no Norte e lá sempre neva. De que cor são os ursos lá?

Adotou-se o seguinte procedimento: apresentava-se um silogismo completo, solicitava-se que o participante repetisse o silogismo e em seguida que desse a resposta a questão do silogismo.

Dentre 11 participantes de sexos e escolaridades variadas, apenas uma partipante não conseguiu responder corretamente ao silogismo do urso polar - distante de sua realidade. Porém ela e todos os demais responderam corretamente, mesmo que não de imediato, aos silogismo do carro - elemento comum e rotineiro em nossa sociedade.

Sugerimos que o fato da participante que não respondeu ao silogismo do urso corretamente ser analfabeta funcional explica em parte a sua dificuldade de formação do pensamento lógico abstrato. Luria verificou que o grau de escolaridade das pessoas em linhas gerais correlacionava-se positivamente com a capacidade de abstração e com o desenvolvimento das funções psicológicas superiores.

A despeito de nossa investigação ter uma série de características - temporais, de composição da amostra, de procedimento, entre outras - que a diferenciava do experimento originalmente conduzido por Luria, foi muito interessante observar na prática que o pensamento lógico abstrato que para nós parece tão simples pode ser pouquíssimo desenvolvido por falta da devida estimulação. Ficamos extasiadas com essa constatação de maneira tão nítida, discutimos muito a respeito e gostamos de verdade de conduzir o experimento. Esse tipo de trabalho, na minha opinião, é muito mais proveitoso que a simples leitura dos resultados de alguma pesquisa, e faz com que internalizemos os novos conhecimentos advindos dos resultados dela de maneira mais segura e marcante.

Estudo Dirigido

Questões:

1) Quais as principais características da relação psicologia e educação?

A relação entre psicologia e educação é assimétrica, desarmônica. Em relação à educação, a psicologia veio ocupando um espaço que muitas vezes ultrapassa seu limite de conhecimento e competência. A pedagogia sempre buscou outras áreas de conhecimento que auxiliassem na compreensão do fenômeno educativo, mas não houve um cuidado para que esses relacionamentos não fossem superestimados. Dessa forma, algumas áreas de conhecimento passaram a funcionar como soluções últimas e miraculosas para certos problemas acadêmicos, ou pior, foram encaradas como autoridades absolutas. Por lidar com questões relacionadas à aprendizagem e ao comportamento humano, a psicologia serviu como fonte de conhecimento importante para lidar com aspectos do fenômeno educativo. Apesar disso, por não ter tido grande eficácia ao lidar com questões consideradas fundamentais como o fracasso escolar e a melhora da performance de crianças na escola, a psicologia vem perdendo espaço para a medicina, principalmente em se tratando da “ patologização” do não- aprender. A antropologia também tem aumentado sua contribuição na área da educação na medida em que se tem que a consideração da cultura e sua expressão na escola poderia servir como um facilitador da aprendizagem.

Ao se tratar da relação Psicologia-Pedagogia no Brasil, é importante ressaltar ainda que ela não surgiu através de uma problematização da realidade brasileira, tendo havido a importação de um modelo educacional norte-americano. Outra observação que se pode fazer a tal processo de transposição refere-se à alteração dos textos originais, podendo abrir um viés interpretativo errôneo do material a uma conseqüente má aplicação.


2) Quais concepções (sujeito, desenvolvimento, aprendizagem) embasam a influência de cada uma das abordagens teóricas do conhecimento psicológico na relação com a educação?

Alguns autores e abordagens da psicologia tiveram grande influência na busca pelo conhecimento da educação, apresentando contribuições e reflexões sobre a relação entre essas duas áreas.

Uma importante contribuidora para a educação foi a Psicometria, que se utilizou de suas técnicas objetivas e experimentais, e inseriu o famoso teste de QI na área educacional, ainda bastante utilizado. Tal área preconizou medidas de inteligência, de potencialidades e das realizações efetivas da criança e do jovem.

Algumas reflexões também foram feitas sobre o nível de desenvolvimento da criança em idade escolar e sua capacidade de aprendizagem. Sobre essa relação, surgiram três diferentes teorias.

A primeira, defendida por Piaget, Binet e outros, afirma que o desenvolvimento precede a aprendizagem, ou seja, o conhecimento só ocorre se o nível deste for equivalente à idade mental da criança, caso contrário, seria inútil, já que a acriança não terá capacidade de entender o que lhe foi ensinado.

Já James defende a segunda posição teórica, e acredita que o desenvolvimento e a aprendizagem andam juntos.

Koffka e os gestaltistas, defensores da terceira teoria, que nada mais é que a relação da primeira com a segunda, acreditam que o desenvolvimento acontece a partir da aprendizagem, assim como esta depende do desenvolvimento.

Além da Psicometria, a Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento também trouxeram suas contribuições na correlação existente entre aprendizagem e desenvolvimento. Tais subáreas não conseguiram determinar um pensamento linear com a Educação, pois são conflitantes entre si além de terem apresentado reflexões voltadas para os processos do aprender e não de suas relações com as etapas do desenvolvimento.

O behaviorismo por meio da predição e controle do comportamento preconiza que a aprendizagem ocorre por condicionamento clássico e operante, não relevando os processos internos existentes. Tal pressuposto enfraqueceu a força da abordagem na linha de entendimento aprendizagem-desenvolvimento.

A Psicologia Cognitiva passa a ter um maior espaço frente ao enfraquecimento do Behaviorismo, inserindo em seu objeto de estudo os processos internos não considerados pelos behavioristas.

Posteriormente a Psicologia Cognitiva, Piaget desenvolve a dialética aprendizagem-desenvolvimento de forma mais ampla, considerando que as aquisições cognitivas são obtidas em função do processo de adaptação do indivíduo ao seu meio. A Psicologia Cognitiva Social complementa tal ideia inserindo ao conceito citado anteriormente os fatores afetivos e emocionais do sujeito. Para esta última abordagem a interação social tem um papel definitivo no desenvolvimento cognitivo do indivíduo; a situação de confronto com o conhecimento do outro provoca um conflito que impulsiona a dinâmica do desenvolvimento cognitivo.


Este estudo foi feito pelas alunas Denise Clésia, Lígia Carvalho Libâneo Francisca Juliana, Jéssica Azevêdo, Melissa Castro e Sheila Rocha.

Tirinha


Essa tirinha circulou muito por e-mail em 2009. Acho que ela representa realmente bem um fato verificável atualmente na sociedade em diversos contextos, que acaba por se refletir também na escola: a subjugação dos pais pelos filhos. Apesar dessa lógica a meu ver incorreta, hoje em dia os pais têm medo da rejeição dos filhos, de dizer "não", de impor limites. Os filhos generalizam essa falta de limites vivenciada em casa para outros ambientes, como a escola. Lá, não somente desrespeitam os professores como também os desfiam, se afirmando com frases do tipo "você não manda em mim", "vocês não são meus pais" e a clássica "são meus pais que pagam o seu salário". Alguns pais, por sua vez, também querem que seus modelos de educação sem imposições sejam adotados pela escola - afinal, não se pode traumatizar o menino dando a ele uma nota baixa - e por isso se impõem, selecionam os currículos adequados ou não, opinam de forma impositiva sobre certas atividades e fazem de tudo para que a metodologia da escola não possa oferecer nenhum desapontamento ou reprovação aos seus filhos. Desse modo, muitas vezes os professores se vêem impedidos de realizar bons projetos ou sugerir ideias inovadoras, bem como ficam bastante limitados na hora de avaliar as crianças. Isso para falar apenas dos pais, sem contar os impasses entre professores e coordenadores, diretores, psicólogos escolares, psicopedagogos, órgãos responsáveis pela educação etc.

Enfim, o que desejo essencialmente por meio dessa tirinha é reforçar que a escola não pode se conduzir como uma instituição alheia ao que ocorre do lado de fora de seus muros. A escola é influenciada pela sociedade em que se insere, pelo seu tempo, sua localização e principalmente, pelos modelos políticos vigentes. Tentar escapar à esta realidade só prejudica aos maiores beneficiados pela escola: os alunos. Por isso a escola precisa, antes de tudo, assumir-se como mais um dos diversos contextos e espaços onde a criança se desenvolve, para daí elaborar, discutir e pesquisar as melhores formas de se relacionar com estes outros contextos que tanto a influenciam.

Cuidado, Escola!

ANÁLISE CRÍTICA – “CUIDADO, ESCOLA!”

Há muito que se discute o papel das escolas no desenvolvimento infantil. Fala-se sobre as práticas curriculares, formas de incentivar os alunos, programas de aulas, horários etc. Entretanto, nem sempre essa discussão é ampliada para tratar do alcance das vivências experimentadas na escola quando generalizadas para outros contextos, ou de modo semelhante, quando a escola é vista como apenas parte (importante, mas não única) dos muitos espaços de desenvolvimento com os quais a criança tem contato.

Sob essa perspectiva, a escola não deve ser tratada como contexto estanque do desenvolvimento infantil, alheio ao mundo exterior onde vive a criança. Infelizmente, nem sempre é assim que a escola é entendida. O livro “Cuidado, escola!” (Harper, Ceccon, Oliveira & Oliveira, 1985) volta a atenção do leitor para o contexto sócio-histórico em que a escola está inserida, sugerindo que através dos seus diferente métodos de ensino, a escola repete e reflete a posição política dominante de sua sociedade, bem como os valores e ideologias mais bem aceitos por ela.

É interessante notar que a proposta do livro e as reflexões que ele traz são muito pertinentes ainda atualmente, a despeito de ele ter sido publicado na década de 1980. Apesar de não ter vivido a “crise escolar” dessa época, o livro a descreve com muita clareza e é possível notar que os problemas que geravam insatisfação em professores, pais e alunos, bem como o temido “fracasso escolar” são muitos os mesmos até hoje. Percebe-se que a maior parte deles decorre da dificuldade de considerar a escola como parte da vida dos alunos que deve se integrar e se relacionar com os outros aspectos da vida do estudante.

Entendo que uma pequena porção do problema, principalmente para os professores mais velhos, está na dificuldade dos docentes de aceitarem as mudanças do lado de fora dos muros da escola, mudanças sociais, tecnológicas e culturais que se demonstram na diferença de comportamento dos alunos ao longo dos anos. Penso que muitos professores não se empenham em tentar adaptar-se aos novos interesse, formas de expressão e pensamentos dos alunos. Talvez por isso muitos estudantes não se sintam incentivados com a escola ou desgostem de algumas aulas em particular, pois não se sentem acolhidos ou compreendidos pelos professores, que possuem um mesmo estereótipo de “comportamento exemplar dos alunos” desde a época em que foram ensinados.

O professor precisa discriminar o que é interessante para a classe, quais formas de transmissão do conteúdo, demonstrações e até mesmo de linguagens diversas capturam a atenção dos alunos, e tentar trabalhar com isso de uma forma na qual não se perca a autoridade. É importante também transferir o foco do ato de ensinar para o de aprender. Apesar de este último ser, a meu ver, o objetivo essencial de qualquer professor, muitos não o exercitam na prática, julgando seu desempenho apenas pelo modo de transmissão dos ensinamentos e não considerando o quanto os alunos compreendem dessa transmissão. Dessa forma, é muito fácil transferir a culpa pelas dificuldades de aprendizado exclusivamente aos alunos...

Um dos pontos do texto que mais me intrigou foi a descrição de como os alunos são precocemente, ao seis ou sete anos, acorrentados à carteira, onde passam boa parte da sua vida em uma mesma posição, tentando aprender os conteúdo em uma pose um tanto desconfortável, além de prejudicial à coluna. Isso é preocupante especialmente para os mais jovens, que estão em fase de desenvolvimento físico e cheios de energia borbulhando para ser liberada. É um aspecto simples da dinâmica escolar e de fácil solução, que pode, entretanto, fazer enorme diferença na motivação dos alunos.

Outro ponto trazido pelo texto que julguei de importante discussão é o que diz respeito à forma de trabalho na escola predominantemente individualista. Os alunos são estimulados com mais frequência a pensarem e estudarem sozinhos do que em grupo. Esse funcionamento também vale para as avaliações, prioritariamente individuais.

A falta de maior contato com os colegas de classe e com o próprio professor durante a aprendizagem mostra que muitas escolas não tomaram consciência da importância do trabalho na zona de desenvolvimento proximal descrita por Vigotski (Vigotski, 2007). De acordo com essa ideia, seria muito válido o trabalho em equipe, assim como as avaliações que contassem com a ajuda do professor, uma vez que a aprendizagem é mais rápida e eficaz se o ensino foi feito por meio de mediações sociais nas quais participaram instrutores mais experientes. Seria muito interessante também, a meu ver, que houvesse mais trabalhos práticos na escola, envolvendo experiências palpáveis que demonstrassem na realidade os conteúdos que em geral são estudados apenas em teoria nos livros.

A escola muitas vezes rejeita a importância do desenvolvimento crítico dos alunos, testando a capacidade que eles têm em assimilar os conteúdos, mas raramente analisando como interpretam e criticam tais conceitos. Acredito que a escola moderna deve incentivar a participação dos alunos em discussões, seminários etc, bem como estimulá-los a pensar sobre o que está sendo aprendido, e não simplesmente a decorar a matéria.

O ideal seria que as avaliações conectassem os conteúdos de diferentes matérias para que o aluno tivesse uma visão global dos ensinamentos, e que contivessem questões que permitissem aos alunos opinar sobre o que aprendem. Afinal, ao saírem da escola, as opiniões dos estudantes como cidadãos e suas capacidades criativas também serão necessárias, em certas áreas mais até do que o conhecimento formal. Ademais, quando chegam à universidade os alunos se deparam com uma grande cobrança do desenvolvimento do senso crítico, e muitos deles encontram dificuldades de se expressar e elaborar os conteúdos, pois não foram devidamente preparados para tanto na escola. O mesmo pensamento é válido para o estímulo à criatividade, inventividade, à liberdade de expressar-se de diferentes formas; as chamadas habilidades transversais, muito pouco valorizadas pela escola, porém de extrema importância para a vida diária dos alunos.

Concordo com a conclusão de que as escolas estão repetindo entre quatro paredes um modelo político de desigualdade social, em que alguns poucos são favorecidos com boas condições de ensino em detrimento de muitos que não serão selecionados e nem mesmo incentivados a levar seus estudos adiante. Não se pode esperar que esse padrão social mude para que a escola o mimetise e enfim, progrida.

Evidentemente, para muitos de nossos governantes não é interessante investir na democratização do acesso à escola ou no progresso do ensino. Por isso é necessário convocar todos os envolvidos com a escola à mudança, a começar pelos professores. Esse sistema ultrapassado precisa ser modificado de dentro para fora, do contrário a escola será sempre refém do Estado.

Por fim, penso que é crucial que a escola comece a relativizar o sucesso e o fracasso escolar. É necessário entender que os alunos jamais apresentariam níveis exatamente iguais de compreensão e aprendizagem. Esses “níveis” variam enormemente em diferentes matérias, diferentes contextos, ou de acordo com a forma de demonstrá-los. Cada estudante tem dificuldade em algum ponto e facilidade em outro. Principalmente, cada estudante tem um ritmo diferente de aprendizagem e cada um deles tem uma forma só sua de estudar que promove o melhor aprendizado possível, que nem sempre é a utilizada pela maioria ou a que os professores entendem como a melhor. Acredito que a escola dará um salto enorme no cumprimento dos seus objetivos quando essas diferenças forem respeitadas.

Referências:

HARPER, BABETTE., CECCON, CLAUDIUS., OLIVEIRA, MIGUEL DARCY DE. & OLIVEIRA, DARCY ROSISKA DE. (1985). Cuidado, escola!. São Paulo. Brasiliense.

VIGOTSKI, L. S. (2007). A formação social da mente. São Paulo. Martins Fontes.